Ela costumava ouvir com prazer os desabafos e problemas dele, mesmo que já tivesse muitos problemas só seus. Gostava de sentir-se útil e importante pra ele, mas cansou de parecer sempre incomodando demais quando era ela quem lhe contava os seus problemas e de ser pedir muito quando apenas queria colo.
Ela, que era tão tagarela, não podia ter dias-de-poucas-palavras ou ele sempre pensava o pior e dela se afastava, ao invés de simplesmente perguntar-lhe o que havia. Preferia começar a ignorá-la ou evitá-la. Se perguntasse, descobriria que na maioria das vezes ela realmente não tinha nada a dizer, queria apenas a companhia dele e se satisfaria com um abraço.
Ela cansou das provas de sua amizade nunca serem suficientes. Cansou dele sempre parecer desistir dela tão facilmente. Cansou dele não prestar atenção a como falava com ela porque achava que ela sempre iria entender e perdoar. Cansou dele dizer evitá-la porque, pra ela, ele não conseguiria fingir estar bem e, agindo assim, ele não lhe permitir ajudá-lo quando ele estava mal. Cansou de se sentir sozinha em momentos que ela tanto precisava dele e ele nem notava. Cansou de ser abandonada por ser especial.
Quando ela desistiu de lutar, não teve ninguém pra lutar por ela, pra sentir sua falta, pra perguntar ‘por quê?’ ou pedir pra ela voltar. Ele era orgulhoso demais pra assumir que os erros pudessem ser seus ou para procurá-la pra saber o que tinha acontecido para ela estar tão diferente. Não estava disposto a perdoá-la se os erros fossem dela. Ele apenas a deixou partir. Com essa atitude confirmou todas as suspeitas dela: ela não lhe servia mais. Ela, então, sem receios, partiu.
"Quando partiu, levava as mãos no bolso, a cabeça erguida. Não olhava para trás, porque olhar para trás era uma maneira de ficar num pedaço qualquer para partir incompleto, ficado em meio para trás. Não olhava, pois, e, pois, não ficava. Completo, partiu." Caio Fernando Abreu
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